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Papo Direto

Lucien Belmonte, superintendente da Abividro, fala sobre os desafios da indústria vidreira

O executivo conversou com a revista Vidro Impresso sobre os desafios enfrentados pelo segmento, especialmente no que tange aos aumentos de preços vivenciados nos últimos tempos

08/05/2019

O administrador Lucien Belmonte é superintendente da Abividro (Associação Brasileira das Indústrias de Vidro) desde agosto de 2000 e vem participando ativamente da evolução da indústria vidreiro no Brasil na defesa dos interesses do setor. Desde setembro de 2018 é também diretor adjunto de infraestrutura da  Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). O executivo conversou com a revista Vidro Impresso sobre os desafios enfrentados pelo segmento, especialmente no que tange aos aumentos de preços vivenciados nos últimos tempos. 

 

O preço do vidro sofreu quatro reajustes em 2018, causando preocupação e especulações no mercado vidreiro. Quais foram os fatores que influenciaram estes aumentos?
Três fatores principais determinam o custo da produção do vidro: barrilha, gás e energia. O preço do gás natural é definido por uma tarifa, um preço público através de uma agência, mas que permite a participação dos agentes privados. Temos que observar a volatilidade dos preços para entender essa parte do custo do vidro. No ano passado, o barril de petróleo variou entre 55 a 90 dólares, e o dólar oscilou de 3,60 a 4,20 reais. 

 

Ainda estamos pagando por esses valores porque há um atraso na formação do preço, mesmo hoje o dólar estando R$3,90 e o barril de petróleo 65 dólares, há um reflexo seis meses depois. Esses valores mais baixos irão interferir somente daqui três meses. Já a energia tem uma volatilidade em função de chuva e diversos fatores que não podem ser previstos, por isso não há como ter preços estáveis. Também pagaremos por uma diferença no preço do gás nos próximos três meses, e nas oscilações em vez do preço cair ele sobe. 

 

O gás ano passado aumentou 21% em junho, em fevereiro deste ano 37%, valor recalculado para 23% no mês de março em função da mobilização de representantes de diferentes setores da economia, mas baixou provisoriamente e será calculado em maio. Alguns componentes da formatação do preço do gás refletem dois anos depois, isso significa que teremos consequências destes custos até o final de 2019. 

 

Quais insumos utilizados na produção do vidro são importados e impactados pela alta do dólar?
A barrilha para a produção do vidro é toda importada, não tem produção nacional. O gás também é todo dolarizado, então, mesmo que a fabricação seja nacional alguns preços são dolarizados. Não é porque é produzido aqui que não é influenciado pelo dólar. Outro custo dolarizado é o contábil. Todo maquinário e investimento no forno tem também depreciação dolarizada.  

 

Qual o papel da Abividro como representante das empresas fabricantes de vidro no Brasil? 
A Abividro acompanha a competitividade da indústria do vidro através de políticas públicas. Temos participação ampla em diferentes frentes para promover a indústria do vidro. Fui até recentemente coordenador do Fórum do Gás, que reúne 14 indústrias para discutir a competitividade do gás. Como diretor de infraestrutura na Fiesp participo do fórum “Gás para Crescer”. Discutimos ainda políticas públicas em várias frentes de regulamentação do setor de esquadrias, assim como alternativas para melhorar a logística junto aos governos. 

 

Um outro problema enfrentado, segundo consumidores do produto, é que faltou vidro. O que diria sobre algumas especulações de que a indústria não tem conseguido abastecer o mercado interno porque focou nas exportações?
A falta de vidro foi um tropeço momentâneo de mercado, não uma questão estrutural. As usinas possuem capacidade para atender ao mercado e estão investindo na produção, como por exemplo a AGC, que inaugurou um novo forno com maior capacidade de produção. A questão nada tem ver com exportação, o que pode ser confirmado pelos dados do sistema Alice (Análise das Informações de Comércio Exterior), que registra que houve queda na exportação de vidro no ano passado. 

 

Acredita que passado o período eleitoral diminuirão as incertezas em relação ao Brasil, o que refletirá de forma mais positiva nestes valores?
O mercado que determina negociações com os clientes, é a economia de mercado. Quando passar a reforma da previdência de haverá uma grande mudança de humor. Mas no momento ninguém vê certeza, o que foi prometido não foi entregue. E o brasileiro é muito emocional, pode reagir de forma eufórica ou depressiva. O cenário ainda é incerto, o presidente da República Jair Bolsonaro briga com o presidente da Câmara Rodrigo Maia e o dólar sobe de 3,70 para 4 reais.

 

O mercado tem tido dificuldade de repassar estes preços, até porque no decorrer de uma obra, sem os avisos prévios de aumentos, o orçamento é alterado comprometendo o lucro da obra. 
Como disse Tom Jobim, “O Brasil não é para amadores”. Esses custos são complexos. Tem fábricas que calculam seu próprio índice de inflação, a inflação do vidro. Porém, quando um empreendedor fecha um contrato de longo prazo existe um custo que vai alterar no decorrer da obra que pode ser estimado pela volatilidade. O preço do gás e energiasão previsíveis, já a oscilação da moeda é menos volátil. 

 

O avanço da China com produtos mais competitivos tem impactado também a indústria do vidro?
A China é um mundo à parte e o todos têm discutido como lidar com eles, é uma questão que transcende o setor de vidros. Na OMC (Organização Mundial de Comércio) é o maior objeto de ações de defesa comercial porque é realmente muito diferente a forma com que eles produzem e formam preços. 

 

Quais outros desafios da indústria vidreira?
Acredito fortemente que a solução está sempre no vidro. O desafio está em oferecermos o vidro certo na hora certa, em nos aprofundarmos para vender essas soluções. Há soluções específicas para o País, é diferente vender vidro na Suíça e nos Emirados Árabes. 

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