Conforto para os ouvidos

Conforto para os ouvidos

Capa: Conforto para os ouvidos

Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo, o consultor João Gualberto Baring é um dos mais renomados especialistas em acústica do Brasil. Coordenador da Comissão de Estudo de Desempenho Acústico de Edificações, da ABNT, Baring acredita que, se estiver empenhado, o mercado será capaz de se adequar com facilidade às exigências da norma NBR 15575, que teve vigência adiada para 2012.

Diferente de outros padrões, que tratam de sistemas construtivos ou materiais, a NBR 15575 aborda o comportamento global do edifício, considerando as necessidades do usuário. Professor de Acústica do Controle do Ruído na Escola Politécnica da USP, Baring já atuou como pesquisador convidado do The National Institute of Standards and Technology, nos Estado Unidos, presidiu por três anos a SOBRAC – Sociedade Brasileira de Acústica e foi membro de comissões para regulamentação do controle do ruído urbano no IBAMA e nos governos de Mario Covas, Luiza Erundina e Jânio Quadros.

Em entrevista para Vidro Impresso, o professor defende que o setor vidreiro participe das discussões em torno da norma, lado a lado com o de caixilhos, principais responsáveis pelo desempenho acústico de edificações.

 

 

Vidro Impresso – Qual a importância do conforto acústico em casa e no ambiente de trabalho? Ou seja: quais as conseqüências do desconforto acústico para a saúde e o desempenho profissional?

Baring – O desconforto acústico pode afetar, em maior ou menor grau, o estado de atenção e o equilíbrio emocional das pessoas. Quanto mais nos sentimos desconfortáveis, menos conseguimos desfrutar do descanso e do lazer e menos conseguimos nos concentrar nas nossas tarefas. A insatisfação leva ao desgaste e à irritação, com as previsíveis consequências para a saúde e a produtividade.

 

 

 

A busca de conforto térmico, por meio de janelas e ventilação natural, frequentemente reduz o conforto acústico. Como equacionar esse problema, já que a recíproca tende a ser verdadeira?

O conflito entre ventilar e conter o ruído externo através de janelas decorre de projetos em que não se deu atenção ou se subestimou o problema. No exterior,
em cidades onde o inverno é rigoroso, o conflito entre ventilar e conter a friagem externa é resolvido, e as janelas nunca são o único meio de ventilação
dos ambientes.

 

 

 

Há como dispor de ventilação que não dependa de abrir janelas?

Com certeza. No nordeste já se usam os chamados “peitoris ventilados”. Só falta serem adaptados para que também reduzam o ruído externo.

 

 

 

Os ruídos externos encontram nas fachadas os pontos mais vulneráveis. Quais os cuidados necessários para evitar problemas nesse sentido?

 

Ao se encomendar os projetos, os impactos do ruído externo à frente, nos  fundos e nas laterais do terreno devem estar devidamente avaliados. Por
exemplo, evitar voltar fachadas com dormitórios para o impacto maior é o mínimo que se pode fazer, em termos de bom senso.

 

 

 

Um estudo seu constatou um aumento de 10 a 15% no custo da obra na hora da edificação e praticamente de 100% para corrigir problemas acústicos. Em
que medida funcionam esforços para aumentar o conforto acústico depois de pronto o edifício?

Salvo raras exceções, são complexos caros e, quando internos às unidades, transtornam a vida dos usuários. A tecnologia permite ir até às últimas consequências, mas, dado o ônus, normalmente chega-se a um alívio do problema e não à sua solução, como desejável.

 

 

 

Como o setor vidreiro tem respondido à demanda por conforto acústico?

Os produtos que o setor oferece, na parte que lhes cabe nos projetos visando conforto acústico, cobrem bem as demandas pelos mais variados índices
de desempenho.

 

 

 

O vidro em si é um bom isolante acústico? Por que o material não é mais explorado na construção civil?

No embarque de aeroportos bem projetados, com caixilhos bem dimensionados, temos a resposta para essa pergunta. Vemos os aviões decolando
e ouvimos, quando muito, um simples rumor. O material só não é mais explorado na construção civil porque a oferta de caixilhos bem vedados, acusticamente, é ainda muito restrita. Ninguém vai investir em um vidro com desempenho muito acima do que o caixilho pode oferecer.

 

 

Acredita que o setor deva participar das discussões sobre conforto acústico em curso na ABNT (a NBR 15575)?

 

Sim, mas junto com os fabricantes de caixilhos, pois a qualidade dos produtos de ambos será responsável pelos resultados que a norma preconiza. Certamente há uma tendência de aumento do uso do vidro na construção civil a partir das novas exigências da ABNT. Ou seja, o uso de vidros pode ser uma boa solução para atender a nova norma, desde que o setor vidreiro trabalhe em parceria com o dos caixilhos.

 

 

Como avalia o desempenho dos vidros especiais para isolamento acústico? O que isola melhor: um vidro duplo ou um vidro espesso?

De nada adianta um supervidro instalado num caixilho com perfis e vedações que deixam vazar os sons. Nas aplicações críticas, os detalhamentos e especificações deverão ser coerentes.

 

 

Poderia citar um exemplo de vidro especial para isolamento acústico que o sr. recomendaria?

Considero especiais todos os vidros que não são monolíticos, começando pelos laminados e chegando aos que têm espaçamento de ar, entre lâminas,
projetados com vistas ao desempenho térmico. Entre os laminados, existem os que têm “PVB acústico”, nesse caso, sim, com um incremento de desempenho nesse sentido.

 

 

De que forma eles são capazes de promover esse isolamento?

Como o PVB é um filme de material que, apesar de muito fino, consegue se contrair e dilatar bem mais do que o vidro, quando colocado como “miolo”
em um vidro laminado, aumenta o amortecimento interno das vibrações, o que beneficia o desempenho acústico quanto à isolação sonora.

 

 

Fabricantes e construtoras estão mais conscientes com relação à poluição sonora?

Com certeza. Algumas construtoras já estão formulando seus procedimentos para enfrentar esses problemas.