Na rota da reinvenção

Na rota da reinvenção

Capa: Na rota da reinvenção

Pela primeira vez, em muitos anos, a palavra de ordem ‘temos que economizar’, recorrente em tempos de recessão, deu lugar a outra: ‘temos que ser eficientes’. A Revista Vidro Impresso entrevistou 25 lideranças – entre empresas e entidades do setor – que decidiram compartilhar suas estratégias e desafios para enfrentar a recessão. E constatou uma óbvia preocupação com a atual situação político-econômica do País, mas também uma forte disposição para enfrentar a crise de frente e contribuir de maneira decisiva para a retomada do crescimento.

Ponto pacífico entre os entrevistados, a crise que assola o País tem afetado não só o setor da construção civil, mas também toda a cadeia produtiva do mercado vidreiro, além de setores relacionados, como linha branca, vidro automotivo e moveleiro, todos às voltas com altos custos de importação e de energia, impostos, contenção de investimentos – públicos e privados – e queda da demanda. Esse conjunto de fatores negativos tem impacto na ponta da cadeia – o consumidor final, retraído e com menor poder de compra. 

A convicção de que a economia brasileira vire o ano com as contas públicas desajustadas e às voltas com um cenário político de incertezas contribuiu para o receio de que o primeiro semestre de 2016 também seja sombrio, levando muitas empresas a operarem numa espécie de ‘modo de autopreservação’. 

 

Expectativas para 2016

 

Cenários de crise costumam gerar consumidores mais cautelosos e mais exigentes com relação a custo-benefício e eficiência energética. Empresas que têm atendido a essas tendências e diversificado sua atuação se mostram menos vulneráveis à crise e mantêm um ritmo de crescimento, ainda que modesto, nas vendas e nos investimentos. Acompanhe a seguir como elas estão enfrentando este momento e o que esperam para os próximos anos. Afinal, “nem tudo são lágrimas”, comenta o presidente da Vidros UBV, Sergio Minerbo, sintetizando a avaliação da crise pelo setor vidreiro.

 

 

AGC “Acreditamos muito no Brasil e estamos bastante otimistas sobre o futuro do País”, afirma Davide Cappellino, presidente da AGC Vidros do Brasil. Apesar de sofrer com o aumento expressivo dos custos, especialmente os energéticos e de insumos importados, a empresa vem buscando soluções que aumentem não só sua eficiência, mas também a competitividade dos clientes e de toda a cadeia do vidro. O resultado é uma logística mais ágil e um mix de produtos mais diversificado. “Provavelmente teremos em 2016 mais oportunidades com produtos diferenciados e de maior valor agregado”, disse Cappellino. A certeza da retomada do crescimento também fez com que a fabricante de vidros investisse na otimização dos seus processos e na capacitação de seus funcionários. 

 

Para a empresa, o consumidor brasileiro estará, nos próximos anos, menos focado em achar um novo espaço para viver e mais interessado em transformar o espaço atual em um lugar mais bonito, seguro e confortável. Para acompanhar essa nova fase, a AGC pretende trabalhar o vidro pintado e temperável Lacobel T, para ambientes internos e externos; o vidro antibactéria; o vidro corta-fogo e o espelho AGC.

 

Vivix Vidros Planos – A Vivix acredita em tornar os processos mais eficientes. Apesar da crise, a empresa manteve investimentos e concretizou importantes projetos em 2015, com base no grande potencial de crescimento do mercado de vidros planos. A fabricante ampliou o mix de produtos, iniciou a produção de novas linhas de vidros laminados (Vivix Lamina) e do seu mais recente lançamento, a linha de espelhos Vivix Spelia, e espera fortalecer sua participação no mercado em 2016. “Nossas expectativas são positivas, mas sabemos que o próximo ano demandará grande esforço”, avalia o diretor comercial e de marketing, Henrique Lisboa. Para enfrentar o cenário econômico previsto, a empresa pretende investir fortemente na capacitação de seus colaboradores e na qualificação da cadeia vidreira.

 

Vidros UBV – A UBV constatou certa redução de consumo de vidro impresso este ano, mas não em toda a sua linha. A empresa tem tido um retorno positivo em alguns segmentos de mercado, como, por exemplo, com a linha de espessos, com aumento de volume e grande aceitação no nicho de mercado ao qual ela se destina. Segundo o presidente, Sergio Minerbo, os parceiros que mais têm tido sucesso com o vidro da UBV são os que souberam comunicar corretamente aos seus clientes os diferenciais do produto. 

 

Saint-Gobain Glass – Eficiência, flexibilidade e união da cadeia do vidro aparecem como palavras-chave para encarar a crise na Saint-Gobain. Para o gerente geral, Gustavo Luiz Siqueira, a recessão não deve engessar os negócios. “Não investir está longe de ser o melhor caminho. Não existe melhor saída do que enfrentar a crise e encontrar as oportunidades nela existentes”, afirma Siqueira, que acredita na recuperação do mercado a partir do segundo semestre de 2016. A empresa tem apostado em uma forte adequação dos custos, com foco no ganho de produtividade e eficiência, na capacitação dos seus recursos humanos, em inovação e no lançamento de novos produtos e serviços, fortalecendo assim a parceria com os clientes neste momento difícil.

 

Cebrace – A Cebrace acredita que é preciso atuar de forma a garantir o crescimento do mercado como um todo, principalmente, com associações, por meio da implantação de medidas regulatórias que a longo prazo gerem frutos para todo o setor. Os diretores executivos, Leopoldo Castiella e Reinaldo Valu, referem-se a um trabalho contínuo feito com instituições como Abividro e Abravidro, no sentido de criação e atualização de normas para os produtos (uso, produção e processamento), visando ao aprimoramento do trabalho realizado e à padronização dos produtos e serviços oferecidos ao cliente final. “Quando o nosso segmento cresce, nós driblamos juntos a crise”, afirma Castiella. Em 2016, a empresa pretende aproveitar sua capacidade já instalada, difundir seus produtos e preparar os profissionais do mercado para trabalharem com as inovações. 

 

Abrasipa – O diretor executivo Daniel Leicand acredita que haverá novas oportunidades em mercados e produtos ainda não explorados. “Vejo, a médio prazo, o Brasil voltando a atrair indústrias e meios de produção, pois, com a alta do dólar, nosso custo volta a ser competitivo”, afirma Leicand. A fabricante de abrasivos vem trabalhando com equipe e custos enxutos, por conta da desvalorização do real e do aumento do custo energéticos, dos impostos e insumos. Para 2016, a empresa prevê investimento em novos equipamentos e processos produtivos, desenvolvimento de novos produtos e tecnologias, a fim de substituir produtos importados, análise de processos e prospecção de novos negócios.

 

 

Alclean – Atuando no segmento de alumínio, a Alclean acredita que a recessão deve ser passageira, como todas as outras vividas pelo país. “Como nos últimos anos vivemos um período de crescimento econômico com inflação sob controle e forte estímulo ao crédito, aqueles com menos de 35 anos sentem-se inseguros, uma vez que não vivenciaram hiperinflação, planos econômicos, o confisco da poupança, as grandes desvalorizações cambiais etc.”, argumenta o diretor comercial, Sergio Koloszuk. Para enfrentar a crise, a Alclean ampliou o departamento de planejamento e controle de produção e as equipes de P&D e Vendas, aumentando sua base de clientes. Além disso, a empresa não só não demitiu como contratou e se diz apta a enfrentar um 2016 pior que 2015, porém, com uma equipe preparada, capacidade produtiva preservada e novos produtos. A aposta continua sendo no Kit Pia e no Kit Sacada.

 

Corriflex – Dedicada a produzir acessórios em aço inox para vidro, corrimão e guarda-corpos, a Corriflex prefere investir com cautela no ano que vem, mantendo a mesma estratégia deste ano: a da atenção. Para o presidente Martín Halon, 2016 será muito similar a 2015, com altos e baixos e incertezas pairando nas áreas política e financeira do país. Apesar de acreditar que épocas de crise são de grandes oportunidades para visionários, o executivo confia na sólida estrutura de 20 anos da empresa, para garantir uma travessia tranquila pela crise. 

 

Ideia Glass – Para o proprietário da Ideia Glass, José Miguel, apenas bons administradores sobreviverão à crise. “É preciso olhar apenas para projetos que realmente darão retorno”, recomenda Miguel. Para manter-se competitiva, a empresa vem cortando custos, mas também investindo em pessoas, por meio de treinamentos e cursos, e implantando sistemas de metas internas. “ É o único bem que traz resultados a curto e a médio prazos”, justifica.

 

 

Landy Kits – A fabricante de acessórios para fechamentos de box e sacadas investiu em máquinas novas em pontos estratégicos da fábrica, com melhor aproveitamento do tempo delas. Isto ajudou a reduzir custos de produção e aumentar a capacidade produtiva. Para diminuir o desperdício, a Landy Kits aproveitou sua certificação em qualidade e gestão ambiental (ISO 9001 e ISO 14001) para otimizar postos de trabalho, manter qualidade e custos sob controle, sem refugos, sem operações de retrabalho. Apesar da forte influência do câmbio, a empresa manteve os preços com variações menores que as do dólar. “Isso quer dizer que hoje somos mais competitivos que há um ano atrás”, afirmam os diretores Anderson Becheli e Lázaro dos Santos. Para 2016, o crescimento previsto é de 15% no faturamento, com base no aumento de volume em produtos com tecnologia inovadora, como o sistema Hautomatics, de fechamento de sacada automático e elétrico, lançado recentemente. Na certeza de que a crise irá torná-la mais forte, a empresa também está construindo um segundo galpão, de 1.400m2, em Ferraz de Vasconcelos, região metropolitana de São Paulo.

 

Pado – Cautelosa, porém confiante na retomada do crescimento, a Pado tem apostado na sua estratégia de distribuição dos produtos, em automação, inovação e soluções a custo acessível, a fim de ampliar as oportunidades de negócios. “Nossa estratégia é conservadora, mas vislumbra o crescimento no futuro”, explica Selmo Rodrigues, diretor comercial, destacando que a empresa segue um planejamento estratégico de longo prazo, investindo em processos internos, alta qualidade, P&D, treinamento de funcionários e revendedores e apoio aos atacadistas e distribuidores. 

 

WR Glass – Certificada pela ISO 9001:2008, a WR Glass quer continuar a investir em gestão da qualidade, além de ouvir e entender as dificuldades dos clientes. “Assim podemos desenvolver mecanismos de auxílio e não frear o consumo neste momento”, afirma o diretor, Willmerson Ramos. Entre suas apostas para 2016 está a Torre Plus – um produto que promete mais segurança ao cliente e praticidade de instalação.

 

Metalúrgica WA – Segundo Regiane Barrinovo Jacção, sócia-diretora da Metalúrgica WA, a missão, neste momento, é aparar arestas, a fim de evitar demissões. Para isso, a metalúrgica tem apostado no diálogo e na conscientização dos colaboradores. Em 2016, a empresa quer investir na ampliação das vendas da Torre Versatti – um produto que veio, segundo a empresa, atender a necessidade de melhoria e inovação no sistema de montagem de corrimão e guarda-corpo e que já apresenta boa demanda.

 

Sandro Acessórios – Para Sandro Menezes, diretor comercial da Sandro Acessórios, em momentos de crise as circunstâncias tendem a influenciar o mercado, mas o que vale é a forma como o mercado reage a elas. Para manter-se competitiva, a empresa investiu em criatividade, capacitação e motivação da equipe. Para os próximos anos, o executivo acredita que, cada vez mais, vidro e alumínio irão se consolidar como uma solução competitiva em preço e qualidade, compatível com as tendências de mercado.

 

Arbax – Mais cauteloso diante da recessão do que os demais setores, o ramo de rebolos segue em frente. A Arbax tem aproveitado a crise para avaliar e reestruturar a empresa, reduzindo custos e preparando-a para 2016. “Será um ano de muitos desafios e queremos ter sucesso”, preveem os diretores, Flavio e Fulvio Sirotto, para quem a solução da crise está na capacitação dos recursos humanos e foco no produto.

 

 

Potência Ferramentas – A fabricante de rebolos para lapidação de vidro tem enfrentado a crise reduzindo ao máximo os custos supérfluos, porém, buscando crescimento contínuo, apostando na qualidade dos produtos. Para Andrey Moreira, diretor da empresa, enfrentar a recessão significa não desistir dos negócios e buscar alternativas para se manter no mercado.

 

Divinal Vidros – Menos otimista, a distribuidora Divinal afirma que “a situação do país é caótica, já vinha dando sinais desde 2013 e deve prosseguir em 2016 até os seis primeiros meses de 2017”. O diretor presidente, José Antonio Passi, acredita que o momento é de cortar despesas. Sem especificar como a empresa está enfrentando a crise e o que planeja para os próximos anos, o diretor acredita em um mercado bem estruturado em termos de oferta e produtos, onde as empresas saberão administrar suas dificuldades para atravessar a recessão. “Não acreditamos em um novo tipo de consumidor, nem na criação de um novo produto milagroso”, diz o executivo.

 

Lotus Metal – De olho em uma possível recuperação do mercado em 2017, na Lotus Metal os ajustes nas despesas fixas e variáveis já vêm sendo feitos desde o 2º semestre de 2014, incluindo contratações de mão de obra especializada para trabalhar nichos de mercado. A empresa também iniciou um forte trabalho de marketing, para prospecção de novos clientes. A distribuidora de metais não ferrosos quer conquistar market share em áreas como a indústria moveleira, construção de obras comerciais e de alto padrão, carrocerias de alumínio para caminhões, silos para armazenagem de grãos, bem como equipamentos para 

produzir e captar energia eólica e solar. O gerente geral José Carlos Garcia Noronha aposta em 2017 como o ano em que o Brasil voltará a crescer, em níveis de 3% a 4% do PIB (Produto Interno Bruto) até 2020.

 

 

Di Vero – “Crise não é sinônimo de falta de oportunidade, e nós preferimos traçar planos, metas e formas de conquistá-las”, afirma Marcos Gaspar, diretor da Di Vero, que acredita que a melhor estratégia é abrir mercados e fidelizar clientes. A empresa admite que houve remanejamentos, mas diz que em nenhum momento os investimentos foram suspensos. “Investimos em 2015 mais que no ano passado, desde o setor fabril até o marketing e o comercial”, acrescenta Gaspar. Em 2016, as apostas da empresa continuarão na linha de box em aço inox e no Prada – um novo modelo de box para vidro padrão que, segundo o diretor, tem tanta aceitação que inspirou o desenvolvimento de outro modelo, com lançamento programado para 2016.

 

Glass Parts – Na fabricante de componentes e peças para a indústria do vidro, a gestão tem foco na excelência no atendimento e no corte de custos, inclusive no quadro de funcionários, com base na meritocracia. Ricardo Costa, diretor executivo, acredita que nos próximos meses muitas empresas estarão em dificuldades, dando espaço a outras mais eficientes, que souberam tornar-se competitivas. Entre as principais ações programadas na Glass Parts para 2016 estão: desenvolvimento de novos produtos, capacitação interna, parcerias e acordos de colaboração mútua. Com relação a essas últimas, a empresa investiu, recentemente, em uma nova unidade com novos maquinários CNC, com vistas a qualidade, redução de custos e fidelização dos clientes. A fim de buscar diferenciais, a fabricante também fortaleceu parcerias na Europa e Ásia.

 

 

Q-Railing – Atuando no ramo de guarda-corpos, a Q-Railing acredita em oportunidades na crise a médio e longo prazos. “Infelizmente, o pior da crise ainda está por vir”, acredita o diretor operacional Martin Mittelstaedt. A explicação, segundo ele, é que o mercado ainda está usufruindo de empreendimentos lançados há alguns anos, mas novos negócios andam escassos. Instalada recentemente no Brasil e já produzindo, a empresa promete manter o investimento, expandir o negócio, contratar novos funcionários para as áreas técnica e comercial, desenvolver novos produtos e criar alianças estratégicas que a ajudem no longo prazo.

 

Como manter a competitividade na crise – dicas dos entrevistados para toda a cadeia do vidro

– Criatividade
– Investir na melhoria do processo produtivo
– Flexibilidade com o mix de produtos
– Eficiência na gestão e no planejamento
– Saber identificar pontos de melhorias na empresa
– Foco em produtos de qualidade e valor agregado 
– Otimismo
– Esquecer a palavra ‘medo’ e agir
– Cautela na gestão dos custos
– Conhecimento de todas as áreas da empresa
– Qualificação da mão de obra
– Estabelecer parcerias
– Criar novos produtos
– Não interromper os investimentos
– Segurar ao máximo o ajuste de preços
– Não potencializar a crise
– Inovar e buscar diferencial
– Desenvolver novos canais, como exportação
– Acreditar no País
– Foco em gerar soluções para os clientes
– Espírito empreendedor

 

 

“Esse é o momento de focar na estratégia, rever os processos e se preparar para um novo ciclo de crescimento que, sem dúvida, virá”

 

 

A crise na visão das instituições

Entidades setoriais observam o retraimento do setor com um olhar crítico para a relação capacidade instalada x demanda. O presidente da Associação Catarinense das Empresas Vidreiras (Ascevi), Rafael Nandi da Motta, recomenda que as empresas diversifiquem e mantenham a qualidade dos produtos.
O movimento de green building também pode oferecer muitas oportunidades ao setor vidreiro, especialmente nos temas relacionados a eficiência energética e saúde, bem-estar e produtividade nas edificações. O diretor executivo do Green Building Council Brasil, Felipe Faria, revela que, apesar da crise, o GBC Brasil computou 31 novos projetos, em diversos segmentos. “Os prédios verdes e inteligentes vieram para ficar. E, nesse aspecto, vidros e alumínio têm um papel fundamental”, sustenta o presidente executivo da Associação Brasileira do Alumínio (ABAL), Milton Rego.

Para o vice-presidente de Comunicação e Eventos da Associação Nacional dos Fabricantes de Esquadrias de Alumínio (AFEAL), Edison Claro de Moraes, o segmento do alumínio voltado para a construção civil só tem respirado devido aos lançamentos imobiliários ainda em construção e ao grande déficit habitacional no país. Milton Rego, concorda com Moraes e acredita que há uma demanda potencial que, mais cedo ou mais tarde, irá se recuperar.

Todos concordam que é hora de apostar em eficiência energética, recursos humanos e novas tecnologias, sem deixar de fazer a clássica lição de casa, de reduzir os custos. Mudar o conceito de ‘produto’ para ‘solução’ é outra dica para uma maior proximidade com o cliente nesta nova fase. Há consenso de que é nesta direção que as empresas devem olhar.