O VIDRO TEMPERADO É UM MATERIAL RESISTENTE, MAS, ALGUMAS FALHAS NO PROCESSO DE TÊMPERA PODEM CAUSAR MAIS FRAGILIDADE E, PRINCIPALMENTE, MANCHAS E ONDULAÇÕES. ENTENDA QUAIS SÃO OS POSSÍVEIS DEFEITOS E QUAIS AS TOLERÂNCIAS DETERMINADAS PELA NORMA TÉCNICA
O processo de têmpera é destinado a aumentar a resistência do vidro em variações térmicas e mecânicas. Em seguida, o vidro passa então por um procedimento de resfriamento de alta pressão através uma série de bicos em posições variadas. “Neste processo, a temperatura do vidro deve ser reduzida de forma a gerar uma tensão em compressão, onde as superfícies e topos do vidro se contraem com o resfriamento e empurram para dentro pressionando o miolo do vidro ainda aquecido, que por sua vez, está em expansão. Dessa forma é criada uma força de tensão em compressão, fazendo com que o vidro eleve sua capacidade de fl exão e resistência a temperaturas maiores”, descreve Rodrigo Seixas Guerrero, diretor de Operações da Cyberglass.
Quebras espontâneas? O vidro temperado é um material muito resistente, inclusive a choques mecânicos. Entretanto, por alguma falha no processo de têmpera, de instalação ou uso incorreto, pode apresentar quebra espontânea como relatado por alguns usuários. Um dos principais motivos para esta ocorrência pode ser a presença de partículas de sulfeto de níquel (NiS) na massa do vidro float, que não são visíveis e, portanto, não são detectáveis durante o processo de fabricação.
Uma vez que o vidro é instalado, o níquel sulfeto é aquecido por energia solar e pequenas rachaduras podem se desenvolver a partir da inclusão. Se essas rachaduras penetrarem na camada de tensão do vidro temperado, a liberação de energia resultante fará com que o vidro se quebre espontaneamente. “Inclusões de níquel sulfeto não é um fenômeno novo, na verdade, ele é conhecido e estudado por processadores de vidro há mais de 50 anos.
Para reduzir o risco de quebras espontâneas, o vidro temperado deve passar por um processo chamado Heat Soak Test (HST), um tratamento térmico complementar à tempera, destinado a eliminar os vidros que apresentam risco de quebra espontânea por inclusão de níquel sulfeto. Este processo já é requisitado nos principais projetos internacionais e em muitos países são exigidos por norma. O processo de HTS é opcional e pode ser contratado pelos clientes no momento da compra”, explica Renato Santana, quality control da Glassec Viracon.
Em relação à mudanças de temperaturas, quando processado adequadamente e em condições normais de instalação, o vidro temperado suporta variação térmica na peça de até 200°C, sendo o produto indicado quando há riscos de quebras por estresse térmico. “Para se ter uma ideia, em nossa rotina de testes no laboratório, elevamos a temperatura a 250ºC e colocamos o vidro em água corrente, ou seja, existe uma diferença normalmente de mais de 230ºC e dificilmente ele estoura. No dia a dia, a aplicação do vidro temperado não chegará a tamanha amplitude, então, não considero o choque térmico do vidro temperado”, avalia Guerrero.
Fragilidade dos cantos e bordas
Quando o vidro temperado sofre danos nos cantos ou bordas, as trincas atingem a área de compressão, fazendo com que se fragmente por inteiro. Na verdade, os cantos e bordas são o ponto fraco de todos os tipos de vidros, mas, em outros, esses danos podem ficar ocultos por um longo período antes das trincas se propagarem. Baixa qualidade da borda e danos nas bordas durante a fabricação tornam o vidro mais propenso a quebrar. “Para evitar essas quebras, os processadores devem tomar os devidos cuidados durante todo o processo e o instalador deve obedecer os requisitos da NBR 7199”, ressalta Santana.
“Existe uma força de tensão em compressão, em torno de 20%, das superfícies e do topo existe uma força que pressiona o miolo para dentro, enquanto este está em permanente tensão querendo se expandir. Ao bater a borda, esta camada limitadora pode ser desprendida, reduzindo a tensão de compressão e fazendo com que o miolo consiga se movimentar, o que gera a explosão do vidro. Quanto menor a tensão superficial residual, menor a resistência à choques mecânicos, flexão e amplitudes térmicas. É a tensão imputada no vidro que dita sua resistência”, esclarece o diretor de Operações da Cyberglass.
Outros defeitos
Outros tipos de manchas podem ser causadas por resíduo de estanho ou irisação (ataque químico da água). Se a chapa já vier com defeito, o armazenamento incorreto, em um local com umidade por exemplo, é um agravante e as manchas podem piorar. Outro defeito são as bolhas de ar, porém, há uma tolerância de manchas e bolhas por metro quadrado, mencionadas na norma ABNT NBR 14.698 – Vidro Temperado.
Se for inferior a 3mm e se não houver outras imperfeições no mesmo metro quadrado e do mesmo lado da peça, está dentro da tolerância. A norma trata diversos defeitos, lineares, riscos, arranhões, defeitos pontuais, como nódoas, sujeiras, infundidos e bolhas. Tudo vai depender do tamanho e quantidade de defeitos; não são considerados defeitos menores que 0,2mm.
Anisotropia
Em relação às manchas coloridas, não raramente são provenientes da anisotropia, que não é considerada como defeito de fabricação. O fenômeno conhecido como anisotropia é uma característica óptica do vidro temperado inerente ao processo de têmpera. A Anisotropia é oriunda do próprio processo de tratamento térmico dos vidros temperado ou termo endurecido, portanto, uma vez que o vidro recebe qualquer tratamento térmico, as marcas de anisotropia serão inevitavelmente integradas ao produto.
“Anisotropia é uma marca obtida no resfriamento do vidro. Pode ser atenuada com o distanciamento e melhor distribuição do ar no processo de têmpera, mas sempre realizando a medição da tensão superficial pelo GASP, ou realizando a fratura de um corpo de prova para comprovar a qualidade da têmpera”, sugere Guerrero. “Processadores com equipamento modernos e que possuem experiência em redução da anisotropia conseguem reduzir significativamente esse fenômeno. Entretanto, não há como estabelecer um limite para anisotropia, pois outros fatores potencializam a visualização desse fenômeno”, complementa Renato Santana.
Uma vez que o vidro foi tratado termicamente, a luz polarizada que ocorre em dia normal acentua o efeito bi-refringente deixando principalmente quando o vidro é visualizado em determinados ângulos. Vidros mais espessos (8, 10, 12 mm) e vidros instalados em região litorânea também podem deixar a anisotropia mais perceptível.
Olho clínico do vidraceiro
Para evitar os possíveis problemas relatados, é indicado, em primeiro lugar, escolher têmperas certificadas, pelo INMETRO, por exemplo. “Existem têmperas que não realizam testes de fragmentação, portanto, não sabem ao menos dizer se estão com seus produtos dentro das normas de fragmentação, não existem processos, rastreamentos, ou seja, pode não ser seguro”, comenta o especialista da Cyberglass, ressaltando que os defeitos devem ser identificados no recebimento das chapas de vidro, pois depois de instalado, podem ocorrer a incidência de custos maiores de instalação, insumos e até locação de equipamento.
O vidraceiro, no momento do recebimento do material, deve fazer uma inspeção visual para detectar riscos, bolhas, defeitos de bordas, manchas, etc. Caso encontre algum defeito, deve recorrer a Norma para fazer as medições e entender se é aceitável. “Defeitos visíveis como manchas, riscos e bordas danificadas, sugerimos sempre que seja detectado no recebimento através de inspeção simples, assim evidencia a ocorrência antes mesmo de receber e evita desgaste futuro. Já para defeitos que só podem ser vistos após a instalação, assim que detectado deve comunicar o fornecedor e solicitar a inspeção técnica”, afirma Renato Santana.
É importante também limpar o vidro para perceber riscos vindos da beneficiadora ou da fábrica e depois poder ter clareza se algum risco foi feito depois da instalação, e em ambientes com boa iluminação, observando por diferentes ângulos. É importante fazer a vistoria assim que as chapas de vidro chegarem com bastante atenção e observando na claridade, porque dependendo do espectro da luz pode ser visível ou não as manchas, e como no estoque geralmente não é muito iluminado, acabam passando despercebidos estes defeitos. Além da avaliação visual, algumas técnicas com o tato, pela ponta dos dedos, podem detectar falhas. Resíduos podem ser sentidos pelos dedos.
Realizar as instalações corretamente, conforme recomendações da ABNT NBR 7199, evitará problemas, assim como o manuseio. São fases do processo que também podem provocar danos, mais um motivo para a inspeção ser feita no ato do recebimento dos vidros, assim é possível ter certeza que o defeito veio da têmpera. “O vidro pode ser produzido corretamente mas estar suscetível dependendo de onde ele é instalado, e sua forma de instalação. O transporte ou manuseio não irá alterar o rearranjo molecular do vidro, não irá alterar suas propriedades, mas pode gerar defeitos como riscos, lascas, etc, para isto recomendamos sempre a armazenagem e acomodação de acordo com a ABNT NBR 7.199 e NBR 14.698 – Vidros Temperados”, sinaliza Rodrigo Seixas Guerrero.