Quanto maior, melhor

Quanto maior, melhor

Capa: Quanto maior, melhor

O universo dos envelopamentos de edificações está cada vez mais audacioso. Fachadas envidraçadas tornam-se maiores a cada ano, assumindo novos contornos e transgredindo as barreiras do que é possível com o uso do vidro. Para acompanhar a crescente ousadia que emerge dos escritórios de arquitetura, com projetos que muitas vezes parecem transcender os limites impostos pela tecnologia, chapas de vidro ganham dimensões inimagináveis até pouco tempo atrás. 
As recentes transformações nos métodos adotados por arquitetos, engenheiros e projetistas de fachada tendem a lançar novos desafios para a indústria nas áreas ligadas a estruturas e aplicações em vidro. Tais profissionais têm encontrado nos vidros de grandes formatos uma ferramenta natural para suas criações, especialmente por serem a forma mais eficiente de trazer luz natural aos ambientes, além de ampla visibilidade sem emendas. “Cada vez mais, arquitetos, engenheiros e decoradores trabalham com vidros de grande amplitude para fundir o ambiente interno ao externo. Somente o vidro tem esse poder de integração”, comenta José Antônio Passi, diretor da Divinal Vidros

 

Projeto com vidros da Glassmaxi

Projeto com vidros da Glassmaxi, de Salvador. Vitrines de loja são algumas das aplicações mais comuns de peças de grande dimensão 

 

Para que se concretizem da forma como foram idealizados, no entanto, os novos projetos tornam imprescindível um processamento rigoroso das unidades de grandes dimensões, de modo a garantir segurança na aplicação, afirma o engenheiro britânico James O’Callaghan, um dos mais reconhecidos especialistas em vidros estruturais da atualidade. “Afinal, sem segurança, os projetos nunca saem do papel”, diz o engenheiro, responsável, entre outros revolucionários projetos, pelas fachadas envidraçadas de inúmeras lojas da Apple ao redor do mundo (leia entrevista com O’Callaghan na página 18). 

 

Para citar alguns exemplos emblemáticos, a Apple Store de Sydney, na Austrália, usou em sua fachada as maiores chapas de vidro laminado produzidas até então, com nada menos que 14 m de altura por 3 m de largura. “Os painéis exigiram o uso de uma autoclave especialmente projetada para dar conta de um processo de laminação desta grandeza”, comenta o engenheiro. Já a Apple Store da 5a Avenida, em Nova York, erguida em 2006, teve seu projeto completamente reformulado cinco anos mais tarde, quando tecnologias mais recentes permitiram que seus 106 painéis fossem substituídos por apenas 15 peças laminadas e temperadas, com dimensões de 18 X 3,6 m. O objetivo foi reduzir emendas e dar à escultura de vidro o aspecto de uma verdadeira joia transparente.

 

Apple Store de Sydney, na Austrália

A Apple Store de Sydney, na Austrália, recebeu as maiores chapas de vidro laminado produzidas até então, com 14 m de altura

 

Mercado incipiente

 

Mundo a fora, a corrida da indústria para se adaptar a essa nova realidade acelera-se em todos os elos da cadeia, especialmente em países europeus e do Extremo Oriente, onde extensas áreas envidraçadas e com mínimos recortes e emendas atendem de forma singular aos propósitos artísticos da arquitetura moderna. Não é à toa que essas regiões hoje concentram cerca de 90% dos fornos de têmpera para vidros de grande dimensão. Em termos de tamanho, esse tipo de vidro ultrapassa – e muito – as medidas das chapas de mercado (em torno de 2400 x 3210 mm). Até 2007, os vidros chamados jumbo, isto é, as dimensões máximas de uma folha de vidro, chegavam a medir 6,000 x 3,210mm. De lá para cá, as medidas se tornaram cada vez maiores, e hoje o mercado mundial disponibiliza medidas de até 9000 x 3200 mm. 

 

Embora no Brasil a difusão dos vidros jumbo esteja dando seus primeiros e tímidos passos, está claro para o mercado que o uso dessas peças na arquitetura é uma tendência mundial que deve se impor também aqui. Por essa razão, as processadoras têm dado especial atenção a esse tipo de vidro, despendendo novos investimentos e recursos em máquinas e tecnologias que garantam a ampliação do processamento de chapas de grande dimensão. 

 

É o caso da Conlumi, beneficiadora paulista que desde 2001 processa vidros de dimensões maiores que as convencionais. “Com a influência do mercado europeu e americano, a arquitetura tem sido atraída pelo uso do vidro jumbo, pois é arrojado, seguro e exclusivo, tornando o empreendimento diferenciado. Observando o desempenho de nossa economia podemos crer também no crescimento deste setor.  A construção de novos estádios, aeroportos, hotéis e shoppings já provocou aumento da demanda”, comenta Claudio Passi, diretor geral da empresa. Segundo ele, esse é um mercado em tímida expansão, mas com amplo potencial de desenvolvimento. “Quando focamos na construção civil, as possibilidades de beneficiamento do jumbo incluem insulagem, têmpera, laminação e blindagem. A Conlumi processa todos os beneficiamentos, inclusive o corte por jato d’água”, informa Passi.

 

Manuseio de chapas jumbo em fábrica da Conlumi

Manuseio de chapas jumbo em fábrica da Conlumi

 

Além de empreendimentos comerciais, os vidros jumbo são hoje aplicados em residências de alto padrão ou ambientes como salas e halls de entrada com pé direito duplo. “Com o avanço da tecnologia na produção e beneficiamento de vidros especiais, já podemos antever um aumento na oferta de maneira gradativa, fazendo do preço um detalhe. Esse mercado tem evoluído ano após ano, mas o volume da produção de vidros jumbo só aumentará com o amadurecimento do consumidor, pois existe ainda uma grande lacuna de produtos a surgir e ocupar o lugar de outros materiais”, explica o diretor.

 

A dimensão máxima existente no Brasil é de 6.000 x 3.210mm, informa o diretor da Divinal Vidros, José Antônio Passi. “Mas costumamos considerar como vidros jumbo todas as peças que fogem dos tamanhos tradicionais. Uma peça de vidro instalada em uma janela ou vitrine com dimensão acima de 2.200 x 3.210mm já é considerada de grande dimensão.” A Divinal processa vidros temperados de até 5.200 x 2.600 mm, laminados de até 6.000 x 3.210 mm, laminados temperados de até 4.700 x 2.600 mm e insulados termoacústicos de até 4.500 x 2.500 mm.

 

De acordo com o diretor, a primeira coisa que se deve levar em conta ao especificar grandes panos de vidro é a segurança. “Em primeiro lugar analisam-se aspectos como pressão do vento no local, insolação, tipos de fixações, para daí chegar ao produto mais adequado para o projeto”, afirma Passi. 

 

Para Marcelo Martins, gerente comercial da GlassecViracon, o mercado americano e europeu já se mostra maduro neste tipo de aplicação, mas o Brasil tem muito a evoluir. Especializada em vidros arquitetônicos para grandes obras, a empresa começou a trabalhar com o fornecimento de vidros jumbo em janeiro deste ano. “A produção de chapas jumbo exige adaptação da fábrica e altos investimentos em equipamento e logística”, diz o gerente. “No Brasil, as aplicações mais comuns ainda são em fechamentos de lobbies, vitrines de lojas e algumas fachadas.” A GlassecViracon, disponibiliza dimensões acima do usual para vidros incolores, verdes, low-iron, refletivos e low-e.  

 

Um exemplo emblemático de beneficiadora que aposta alto na produção de vidros jumbo é a New Temper, do Rio de Janeiro. Segundo o diretor Ariston de Morais, a New Temper é a única processadora no Brasil preparada para temperar chapas com as medidas oficiais do vidro jumbo, de 3.210 x 6.000 mm. Em 2012, a empresa investiu na aquisição do maior forno de têmpera da América Latina, fabricado pela Keraglass, capaz de processar chapas com dimensões de até 3,21 x 7 m. O investimento, diz o diretor, justifica-se pela crescente ousadia dos arquitetos e o investimento das construtoras em projetos diferenciados que chegam de fora, para atender as demanda dos eventos esportivos que serão sediados no País. 

 

Linha de esquadrias Eco Prime, da Hydro

Linha de esquadrias Eco Prime, da Hydro, indicada pela empresa para instalação de vidros com medidas acima do padrão 

 

Além das chapas jumbo propriamente ditas, Hamilton Maximo, da beneficiadora  Glassmaxi, cita outro tipo de dimensão existente no mercado, de  4500 x 3210 mm, conhecida como “jumbito”. Com unidades em Salvador e Fortaleza, a beneficiadora atua na produção de vidros temperados desde 2001. “O jumbo é um vidro float comum, portanto pode ser cortado, lapidado, furado, temperado, pintado, insulado, curvado e laminado. Na Glassmaxi, todos esses processos são executados, com exceção dos vidros curvados”, informa Maximo. Segundo ele, “imponência, maior visibilidade e a máxima utilização de peças inteiras para fechamentos de grandes vãos são alguns dos benefícios mais procurados quando se opta pelo vidro jumbo.”

 

O melhor aproveitamento das chapas é o principal fator que levou a beneficiadora paulista Cyberglass a investir no campo dos vidros jumbo. Segundo o diretor industrial da empresa, Rodrigo Guerrero, a empresa trabalha com chapas jumbo de 6.000 x 3210 mm, podendo beneficiá-las no tamanho reduzido de 4.200 x 2. 400 mm para vidros temperados e nas dimensões máximas do vidro jumbo para laminados incolores comuns. “No caso dos vidros laminados refletivos, trabalhamos no limite das chapas nacionais convencionais, de 3.210 x 2. 400 mm”, informa Guerrero.

 

Aplicação e fixação

 

De acordo com o consultor de esquadrias Antônio Cardoso, da AC&D Consultoria, o vidro jumbo sempre foi fabricado para ser recortado e vendido em placas menores. “De uns 7 ou 8 anos para cá, no entanto, ele começou a ser especificado inteiro pelos arquitetos, especialmente em residências de alto padrão”, diz Cardoso. “A partir daí, e com o desenvolvimento decorrente de perfis metálicos apropriados, a demanda vem crescendo consideravelmente. Aplicações em fachadas de lojas também requerem vidros jumbo para ampliar a área envidraçada.”

 

O material mais adequado para esse tipo de projeto, ressalta Cardoso, é o alumínio extrudado, por suas vantagens de forma, peso, resistência e vedação. Segundo o consultor, no Brasil poucas são as empresas independentes que dispõem de perfis dimensionados para vencer grandes áreas de vidro. “Cito pelo menos duas delas: Eurocentro e Tecnofeal”, diz o engenheiro. “Grandes estruturas de aço carbono revestidas de alumínio costumam ser uma opção apropriada para esse tipo do aplicação”, acrescenta Lucinio Abrantes, presidente da Afeal.

 

Entre as esquadrias mais adequadas para aplicações do vidro jumbo, Cardoso menciona a linha Única, da Alcoa, cuja bitola atende a essa demanda para janelões e portas de correr, sempre no segmento residencial. “A necessidade de alto desempenho dessas esquadrias vem crescendo à medida que temos normas técnicas cada vez mais exigentes”, afirma Cintia Figueiredo, coordenadora de desenvolvimento de produtos da Alcoa

 

O diferencial de tais estruturas, segundo Cardoso, localiza-se principalmente na resistência dos perfis em seus momentos de inércia, obtidos por meio do dimensional externo, de maiores espessuras e até mesmo de ligas estruturais mais resistentes. 
Dentre as esquadrias em destaque no portfólio da ASA Alumínio, a empresa destaca o modelo Mega 32 como o mais apropriado para receber vidros jumbo. “Seus perfis robustos constituem a solução ideal para o fechamento de grandes vãos, permitindo, até certo ponto, a instalação de peças cujas dimensões ultrapassam as medidas convencionais”, diz o engenheiro Erwin Kriegel, gerente de projetos da empresa.

 

Vidro Jumbo

Transporte realizado pela Vidro Jumbo, especializada em peças de grande dimensão

 

Algumas das mais eficientes soluções de aplicação disponíveis, segundo a engenheira Julia Satt, da T2G, são as colunas de vidro, os sistemas de cabo de aço e o Flexiglass, sistema de fixação totalmente transparente, com tecnologia exclusiva da empresa que permite a conexão entre as estruturas de vidro, inclusive de tamanho jumbo, com total leveza e liberdade de criação. “O Flexiglass permite executar as mais arrojadas formas, de pilares a vigas e colunas.”

 

Dentre os cuidados necessários na instalação, o consultor Antonio Cardoso ressalta a necessidade de checar instalações similares feitas anteriormente. “Isso porque, na maioria dos casos de grandes vãos, não temos câmara de ensaio disponíveis para testes. Tem que acreditar!”, diz ele. “É importante analisar também as condições da obra em relação a acessos, a altura da edificação, pressão de vento, entre outros itens, para avaliação dos equipamentos adequados a serem utilizados”, aponta Marlon Archas, gerente de engenharia da Tecnofeal, empresa que já chegou a içar folhas de mais de uma tonelada para uma cobertura em Moema.

 

Maquinário robusto

 

De acordo com Gabriel Andrade, diretor da fabricante de máquinas Agmaq, as soluções mais avançadas voltadas para o vidro jumbo podem ser encontradas nas linhas de corte automático, carregadores automáticos e pontes rolantes com sistema antibalanço. Os últimos investimentos da empresa nesse campo, informa o diretor, foram no lançamento de uma mesa de corte e um carregador, ambos automáticos e voltados para peças de grandes dimensões. “Temos nos conscientizado da necessidade crescente de desenvolver ferramentas eficazes para processar o vidro jumbo”, diz Andrade.

 

 

O manuseio das chapas costuma ser o ponto mais crítico em todo o processo de transporte, beneficiamento e instalação das chapas de grande dimensão. “Dentro e fora da fábrica, tudo tem que ser apropriado para trabalhar essas chapas”, diz Ariston Morais, da New Temper.

 

Desde o recebimento da usina, o produto exige aparato especial e pesados equipamentos. “Tanto o manuseio como o beneficiamento de uma chapa jumbo só é possível com o auxilio de tecnologias apropriadas e equipamentos próprios em termos de mesas de corte, monovias, ventosas, mesas hidráulicas, basculantes, forno de têmpera, lapidadoras encomendadas para peso extra etc.”, afirma o diretor Claudio Passi. Segundo ele, a particularidade do manuseio consiste em receber a chapa jumbo na posição vertical, transportá-la para horizontal, beneficiá-la e recolocá-la novamente na vertical para o transporte.

 

A compra é feita sob encomenda, diz Hamilton Maximo, da Glassmaxi, e transportada em veículos especiais para transportar vidros jumbo. “Ao chegar ao destino, esse veículo, por meio de sistemas pneumáticos, desembarca o cavalete juntamente com as chapas, que, por sua vez, deverão ser descarregadas e armazenadas no estoque do cliente”, descreve o diretor.

 

Atenta às necessidades atuais de manuseio de chapas maiores, a Italotec, especializada em equipamentos para transporte do vidro, acaba de lançar uma linha de ventosas para vidros de grandes dimensões e uma pinça para transporte de chapas jumbo. Segundo o diretor de produção da empresa, Fabiano Moutinho, os equipamentos têm capacidade para peças de até 1200 kg. “Com o aumento das instalações de fornos de têmpera para processar peças de até 7 metros de comprimento, o uso de vidros de grandes dimensões está cada vez mais comum. Com isso, as dificuldades de manuseio dentro da fábrica e de instalação desses vidros também aumentaram”, observa Moutinho.

 

Especializada em chapas de grande dimensão, a transportadora Vidro Jumbo disponibiliza caminhão com cavalete apropriado, caminhão munck e guindaste para cada situação, além de cavaletes para armazenagem na obra, ventosas de variadas aplicações, pinças, carrinhos especiais para transporte e, em algumas situações, mão de obra para encaixe nos caixilhos. “A melhor maneira de transportar um vidro jumbo é de forma que o cavalete seja maior que o vidro, a fim de que ele fique bem acondicionado”, indica o diretor da empresa, Giovane Moreira.