Belos e Mortais

Belos e Mortais

Capa: Belos e Mortais

 

 

Em uma simpática galeria de Manhattan, delicadamente equilibradas em superfícies espelhadas que destacam ainda mais suas complexas reentrâncias, elas revelam todos os detalhes de alguns dos maiores assassinos da história. Não, não estamos falando de Adolf Hitler, Charles Manson ou Átila. Trata-se de uma série de esculturas transparentes de vidro criadas pelo artista plástico Luke Jerram, que reproduzem as formas e nuances de microrganismos causadores de graves surtos infecciosos que têm atingido a humanidade, como AIDS, malária, varíola e as mais recentes gripes aviária e suína.

 

 

 

Segundo o artista, o objetivo da série, que foi intitulada Glass Microbiology, ou Microbiologia em Vidro, é destacar as formas aterradoras desses agentes infecciosos que, mesmo de dimensão tão microscópica, foram capazes de causar impacto devastador sobre a saúde global, tendo sido responsáveis pela morte de milhões de homens e mulheres. “As pessoas tendem a pensar que esses microrganismos são seres de aspecto assustador, roxos e brilhantes”, comenta Jerram. “Na realidade, eles são na maioria transparentes, por isso a opção pelo vidro como material para esculpi-los.”

 

 

Conhecido por sua linha criativa um tanto incomum, o artista inspirou-se no universo da microbiologia para criar surpreendentes e inusitadas obras de arte, que, marcadas pela transparência e pela simetria, ganham o aspecto de verdadeiras joias de cristal. O trabalho, iniciado em 2004, é resultado de uma parceria com o virologista Andrew Davidson, da Universidade de Bristol, e foi desenvolvido a partir de diferentes combinações de modelos e fotografi as científi cas. “Essas formas e imagens foram transformadas em ‘realidade vitrifi cada’ com a ajuda de Kim George, Brian Jones e Norman Veitch, artistas especializados na técnica do vidro soprado”, revela Jerram.

“São sopradores de vidro especificamente capacitados para trabalhos de cunho científico, que usaram ferramentas e laboratórios adaptados para essa finalidade. Eu levaria uns 30 anos para aprender a fazer como eles”, brinca o criador da experiência.

 Para amplificar os detalhes característicos de cada vírus e bactéria selecionados por Jerram, as esculturas ganharam dimensões 1 milhão de vezes maiores do que os organismos que representam. “É até simples fotografar um vírus com o auxílio de um microscópio eletrônico, mas muitas vezes é bem difícil perceber as minúcias de seu aspecto interno e em ângulos variados, porque estamos usandoa tecnologia em seu limite máximo de capacidade, e a resolução da imagem nem sempre é suficiente”, explica o artista.


Reprodução em vidro do vírus Influenza A ou H1N1

causador da gripe suína.Marcadas pela transparência e
pela simetria,as obras ganham o aspecto de verdadeiras

joias de cristal

 

“Então, para criar as formas com riqueza de detalhes, muitas vezes temos de recorrer à imaginação, saltando do que podíamos ver ao que precisaríamos inferir a partir de modelagens químicas. Por vezes existe uma lacuna e certa dosagem de trabalho intuitivo, de adivinhação mesmo. Este limite entre a reprodução e a imaginação é o que mais me interessa.

 

”microscópicos assassinos, de suas cápsulas e núcleos, está retratado nas obras de Jerram. Brilhantes, seus destrutivos DNAs e RNAs assumem a forma de pontos espiralados esculpidos no vidro leitoso. E não seria um tanto inconveniente jogar tamanha luz sobre a beleza estética de seres tão nocivos? Jerram sustenta que não: “Hoje é comum entre jovens artistas britânicos a tendência de contemplar esteticamente a morte”, observa. Mas sua proposta vai além. “Sobretudo, acredito que meu trabalho tenha uma missão educativa. Os artigos científi cos costumam mostrar figuras coloridas desses vírus, muitas vezes para tornar mais clara sua composição orgânica, mas outras apenas para fazê-los parecer mais assustadores ou por razões meramente estéticas. Trata-se de uma forma tendenciosa de retratar a realidade, já que as fotos registradas pelos microscópios são em preto e branco e esses microrganismos não têm cor alguma, pois são menores do que um comprimento de onda de luz visível.”

 

                                              

                                                           Detalhe da bactéria E. Coli. DNAs e RNAs assumem a forma de pontos espiralados esculpidos no vidro leitoso

 

Na estrada desde 1997, Luke Jerram já criou um considerável número de extraordinários projetos artísticos que inspiraram pessoas ao redor do mundo. Sua produção artística multidisciplinar inclui esculturas, instalações, live art e objetos de design criativos e inusitados, como um anel de noivado falante que criou para presentear a namorada e foi exposto no MOMA, Museu de Arte de Nova York, em 2011. Com ateliê sediado em Londres, o artista dispõe de uma equipe de especialistas formada por engenheiros, artesãos e técnicos para auxiliá-lo em suas criações, de compositores e musicólogos medievais a artistas vidreiros. “Minha própria imaginação é meu único limite”, diz Jerram. “Quando ela vai além, tudo é possível.” Atualmente, as peças da série Glass Microbiology estão espalhadas pelo mundo, em coleções  articulares, galerias e museus. Recentemente, o trabalho foi exposto na Glasstress, feira internacional de arte em vidro realizada  senalmente em Veneza, e no Museu de Arte e Design de Nova York .

 

 

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