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Arquitetura e Vidro

Fórmula mágica

Uso arrojado do vidro ilumina e abrilhanta marcantes espaços culturais ao redor do mundo

13/12/1949

Guangzhou Opera House. A iluminação natural passa por grandes aberturas da fachada trigonométrica em vidro

A complexidade do espaço urbano exige um conjunto cada vez mais sofisticado de equipamentos relacionados a atividades artísticas e culturais. O conceito de estética do vidro já é parte fundamental da arquitetura moderna, e o desafio de aliar esta característica ao seu aspecto funcional, de conferir iluminação natural e adequada aos espaços, tem feito a presença do material uma constante em projetos de equipamentos culturais criados por arquitetos de renome em todo o planeta.
Nas mãos de profissionais que não hesitam em explorar o vidro com irrestrita criatividade, museus, teatros, centros de exposição e complexos multifuncionais ganham novas linguagens arquitetônicas, marcam a paisagem urbana onde estão instalados e, por vezes, acabam por se converter em ícones daquela cidade para o resto do mundo. “É fundamental considerar a experiência do visitante quando se projeta um museu ou qualquer outro espaço cultural”, afirma o arquiteto Yann Weymouth, diretor da HOK Florida, responsável pelo projeto do recém-inaugurado Museu Dalí, na Flórida. “Um grande número de pessoas estarão visitando aquele lugar pela primeira vez e, por isso, a arquitetura deve ser de fácil compreensão e, ao mesmo tempo, uma experiência estimulante, uma aventura”, comenta o arquiteto.

 

Confira alguns exemplos recentes de edificações destinadas à cultura que encontraram no vidro o recurso para dar vazão à arte e à subjetividade e despertar novas sensações não somente nos visitantes, mas também naqueles que apenas passam em frente a elas.

 

Imaginação e tecnologia

 

Uma harmoniosa e bem-sucedida união de tecnologia de ponta e imaginação criativa. Assim pode ser resumida a proposta arquitetônica do Guangzhou Opera House. De autoria de uma das mais celebradas arquitetas da atualidade, a anglo-iraquiana Zaha Hadid, o imponente centro de artes e espetáculos localizado na cidade de mesmo nome, na China, foi oficialmente aberto ao público no final de fevereiro. Pelo projeto, Zaha Hadid conquistou o prestigiado prêmio Pritzker de arquitetura em 2004.

 

O formato dos dois edifícios, construídos em uma área de 70 mil m², foi inspirado na aparência de seixos rolados. Segundo a arquiteta, todo o projeto foi baseado na paisagem natural à sua volta, tendo como ponto de referência principal o rio Pearl, próximo ao empreendimento, evocando os conceitos de erosão e geologia. “A arquitetura foi influenciada pelos vales do rio e pela maneira como ele se transforma com a erosão”, explica Zaha.

 

No prédio maior encontra-se o teatro de 1.800 lugares, com tecnologia acústica de ponta. O prédio menor constitui-se de um auditório multiuso de 400 lugares, além de salas de ensaio e outras instalações auxiliares. O interior e o exterior dos prédios são separados por linhas profundas, que aludem a terra escavada.

 


A luz natural é privilegiada por meio de uma extensa estrutura de alumínio e vidro que transpassa o concreto, delineando curvas que remetem ao curso do rio. Dentro dos prédios, as paredes de vidro, intercaladas às de pedra, favorecem a vista para o belo Pearl River. “Trata-se de um sistema de revestimento que integra cobertura e fachada-cortina, composto por duplas camadas de painéis de vidro e pedra. A zona envidraçada é ‘retorcida’ ao redor do edifício, constituindo formas livres e fluidas”, descreve a arquiteta.  

 

O interior do auditório principal tem paineis modulados de gesso reforçados com fibra de vidro, que criam uma superfície fluida, compatível com o projeto arquitetônico. Ambos os edifícios privilegiam a entrada de luz natural.

 

O Opera House fica no centro cultural de Guangzhou. Seu conceito também propõe uma função urbana, ao unir os prédios culturais adjacentes às torres de empreendimentos financeiros na região de Zhujiang, dialogando com a “nova cidade” emergente. O Opera House conta também com restaurante, bar e café, além do espaço de circulação.

 

Formas surrealistas

 

Museu Salvador Dali

 

A concepção arquitetônica do novo museu dedicado a Salvador Dalí, inaugurado no início deste ano na cidade de São Petersburgo, no Estado norte-americano da Flórida, é tão surrealista quanto a obra do mestre. A instituição substitui um museu anterior montado em torno de uma coleção particular de obras de Dalí, adquirida pela cidade em 1982.

 

A construção do novo prédio de vidro e concreto para abrigar o acervo considerado o mais abrangente da obra do artista consumiu US$ 36 milhões e substitui o antigo prédio com espaço duplicado e uma melhor proteção contra furacões.
A alusão mais evidente à obra de Dalí consiste em uma dinâmica estrutura de vidro que atravessa e parece escorrer sobre a caixa de concreto inacabada, de 17m de altura, que forma a base do edifício de 6,3 mil metros quadrados. Projetado pelo escritório HOK e construído pelo Beck Group, o Museu Dalí conta com sistemas de captação de energia solar para aquecimento de água, de acionamento automático de luzes e de reultilização de água da chuva.

 

Segundo descreve Angela Rossi, gerente de marketing da Novum, responsável pela instalação dos vidros, a grande onda que encobre o museu é formada por uma estrutura de metal com 1.062 painéis de vidro de tamanhos diferentes, formando um átrio no topo do prédio que alcança 22 m e garante a entrada de iluminação natural. A escolha do material recaiu sobre os insulados parcialmente refletivos e de baixa emissividade (Low-e).

 

Com a estrutura em forma de onda, os arquitetos do HOK procuraram imprimir no projeto arquitetônico um pouco da arte e da linguagem de Salvador Dalí. Segundo Yann, diretor do escritório de arquitetura, “o desafio foi descobrir como traduzir tecnicamente todo o movimento e dinamismo da obra de Dalí”. Já a caixa foi apelidada de “Enigma”, nome de um dos quadros do artista. “Nosso desafio maior foi descobrir como resolver os requisitos técnicos do museu e posicioná-lo de maneira a expressar o dinamismo do grande movimento artístico presente nas obras que ele abriga. Era importante que a construção falasse sobre o surrealismo sem parecer banal”, explica Yann.

 

Segundo o arquiteto, os vidros estrategicamente posicionados são os principais responsáveis pela iluminação natural de algumas das obras-primas de Dalí, além de propiciarem amplas vistas para o exterior.

 

Museu Salvador Dali

A estrutura de metal com 1.062 paineis de vidro de tamanhos diferentes forma um átrio que rasga o museu, proporcionando vista para 
o céu e para a costa.

 

 

SALVADOR DALÍ


Catalão nascido em 11 de maio de 1904, foi um dos artistas mais influentes do mundo. Em 1933, adotou o “método de interpretação paranóico-crítico”, baseado nas teorias da psicanálise, associando elementos delirantes e oníricos numa linguagem pictórica realista, com freqüentes imagens duplas e objetos do cotidiano. 
As releituras de Dalí incluem: “A última ceia”, de Leonardo da Vinci, “As meninas”, de Velázquez, e “Angelus”, de Millet. Faleceu em 23 de janeiro de 1989, em Figueiras, sua cidade natal.

 

O olho que tudo vê

 

Cidade das Artes e Ciências

 

No antigo leito do Rio Turia, na cidade de Valencia, na Espanha, se ergue um dos complexos científico-culturais mais importantes do mundo europeu: a Cidade das Artes e Ciências.


Concebido pelos arquitetos Santiago Calatrava e Felix Candela, o conjunto começou a ser construído nos anos 1990, quando a “Generalitat Valenciana” (prefeitura de Valencia) promoveu uma série de intervenções urbanísticas para a incorporação da cidade ao terceiro milênio, e como meio de recuperação da área urbana localizada entre o antigo leito do Turia e a autopista de Saler.


Um dos mais emblemáticos e criativos edifícios do projeto, o chamado Hemisferic foi concebido para abrigar o Planetário do complexo. A proposta arquitetônica do prédio, o primeiro a ser inaugurado, é representar um “olho aberto que tudo vê”. A sala de projeções permite oferecer aos seus 300 espectadores por sessão as mais inovadoras sensações audiovisuais, obtidas pelo mais avançado suporte tecnológico disponível.

 

O olho que tudo vê

“O conceito de movimento e dinamismo está presente no projeto por meio de cancelas curvas em aço e vidro, movimentadas por um sistema hidráulico que, como ‘pálpebras’, abrem e fecham as laterais da cúpula, complementando o efeito do ‘Olho que tudo vê’, que simboliza a ciência e o conhecimento”


O Hemisféric ocupa uma área de aproximadamente 26 mil m², localizada entre o Museu de Ciências e o Palácio das Artes, outros dois edifícios que compõem o complexo. Duas piscinas retangulares limitam a construção, que emerge delas como uma grande cúpula formada por uma parte central fixa (a cobertura opaca), elementos laterais móveis, que funcionam como guarda-sóis, e a lateral transparente, toda envidraçada.


A cúpula ovoide do Hemisféric é formada por grandes lâminas, constituídas por vigas metálicas de 90 m de comprimento, que emergem da água e envolvem a cúpula. As lâminas são providas de enormes cancelas móveis, de modo a simular as pálpebras do olho. “O movimento é obtido por meio de um sistema hidráulico, semelhante ao usado em portões de garagem”, explica o arquiteto Santiago Calatrava. “Os espaços vazios entre as ‘costelas’ formadas pelas vigas servem como janelas envidraçadas, compostas por vidro laminado.”

 

Kunstmuseum - cubo de vidro

 

Kunstmuseum

 

Poucos edifícios marcam tanto a arquitetura da cidade de Stuttgart, na Alemanha, como o Kunstmuseum. Projetado pelo arquiteto Werner Sobek, famoso por suas casas modulares em vidro e aço capazes de produzir mais energia do que consomem, o museu de Arte Moderna de Stuttgart é um cubo de vidro panorâmico durante o dia e uma escultura iluminada à noite. Inaugurado em 2005, o espaço abriga a maior coleção do expressionista alemão Otto Dix (1891-1969) e também as colinas que emolduram a cidade. No quinto e último andar há um restaurante com uma vista privilegiada do centro de Stuttgart.

 

Segundo descreve o arquiteto Frank Heinlein, do escritório Werner Sobek, a fachada do Kunstmuseum é inteiramente composta por paineis duplos de vidro temperado insulado, de alto desempenho e baixa emissividade (Low-e) e que, portanto, ajudam a manter a temperatura ambiente confortável durante todo o ano. Além de temperados, os vidros externos são laminados. A alemã Schollglas foi fornecedora do material.

 

Kunstmuseum

 

O emprego de travessões e vigas de vidro, tanto na cobertura como na fachada, e um sistema estrutural customizado para instalação do aço e do vidro que formam o envelope do edifício são algumas das inovações do projeto destacadas pelo arquiteto. Os vidros foram instalados na fachada com o uso de ventosas e andaimes, informa Heilein. A construção do Kunstmuseum recebeu, ao todo, mais de 9 mil m2 de vidro.

 

 

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